Livro: Quem é o Cristo? - Médium: J. Raul Teixeira |
Há uma passagem nos Evangelhos conhecida como a
estória do jovem rico, citada em Mateus, Marcos e Lucas. Vamos destacar o
relato de Mateus (vers. 18-22). Vejamos o diálogo que se estabelece entre ele e Jesus.
Um jovem
aproximou-se de Jesus e lhe perguntou: Mestre, que devo fazer de bom para ter a
vida eterna? Disse-lhe Jesus: Por que me perguntas a respeito do que se deve
fazer de bom? Só Deus é bom. Se queres entrar na vida, observa os mandamentos.
Quais? Perguntou ele. Jesus respondeu: Não matarás, não cometerás adultério,
não furtarás, não dirás falso testemunho, honra teu pai e tua mãe, amarás teu
próximo como a ti mesmo. Disse-lhe o jovem: Tenho observado tudo isto desde a
minha infância. Que me falta ainda? Respondeu Jesus: Se queres ser perfeito,
vai, vende teus bens, dá-os aos pobres e terás um tesouro no céu. Depois, vem e
segue-me! Ouvindo estas palavras, o jovem foi embora muito triste porque
possuía muitos bens.
Passando por esse trecho, sem nos atermos aos
detalhes desse diálogo, podemos pensar que aquele jovem estava sinceramente
interessado em ser bom. No entanto, analisando atentamente suas perguntas e as
respostas de Jesus, encontramos algo muito diferente do que inicialmente
supúnhamos. Analisemos cada trecho.
Mestre, que
devo fazer de bom para ter a vida eterna? Disse-lhe Jesus: Por que me perguntas
a respeito do que se deve fazer de bom? Só Deus é bom.
Parece estranho que Jesus tenha dado essa resposta à
pergunta do jovem, mesmo porque, inicialmente, supomos que ele esteja realmente
imbuído de boas intenções ao se aproximar do Mestre. Notemos que o jovem disse
“fazer de bom” e não “ser bom”. Jesus corrige seu pensamento afirmando que
somente Deus é bom; que, por enquanto, por mais nos esforcemos, ainda nos
encontramos longe da verdadeira bondade de coração. Além disso, para fazer algo
de bom não implica em ser necessariamente bondoso ou generoso.
Se queres
entrar na vida, observa os mandamentos. Quais? Perguntou ele.
Jesus, que conhecia bem as verdadeiras intenções
daquele jovem, conduziu o diálogo de forma que o fundo do seu coração viesse à
tona. Convidou o rapaz a cumprir os mandamentos das leis de Deus, descritas na
Tora. Mas o jovem, sabendo que são muitos os mandamentos de Moisés e dos
Profetas, quer saber quais ele deveria seguir.
Jesus
respondeu: Não matarás, não cometerás adultério, não furtarás, não dirás falso
testemunho, honra teu pai e tua mãe, amarás teu próximo como a ti mesmo.
Jesus não citaria esses mandamentos se não houvesse
uma necessidade. Por que esses e não outro qualquer? Possivelmente porque
esses, em particular, tivessem alguma relação com o tipo de vida ou com as
atividades que o jovem rico exercia. A riqueza, nos tempos de Jesus, era obtida
principalmente devido às atividades do comércio de mercadorias produzidas na
região ou importadas de outras. O trabalho no comércio exige e proporciona o
desenvolvimento da fraternidade. Talvez por isso Jesus tenha citado as regras
do bom procedimento para essa área de atividades.
Disse-lhe o
jovem: Tenho observado tudo isto desde a minha infância. Que me falta ainda?
Ao responder o que desde a infância o jovem seguia
esses mandamentos não significa que ele, efetivamente, os cumprisse. Assim como
ele, conhecemos as leis de Deus, mas nem sempre as colocamos em prática. Além
disso, o jovem quis mostrar igualmente a boa educação que havia recebido. Mas,
é justamente a pergunta que faz a Jesus que levanta toda a questão dessa passagem
do Evangelho: “o que me falta ainda?” Aqui temos duas possibilidades: esse
jovem, apesar de ser muito rico, sentia que algo lhe faltava na vida, mas não
sabia definir o que seria; mesmo observando os mandamentos da Lei, não
encontrava sentido para sua existência. A outra possibilidade está relacionada
com a maneira pela qual ele se aproximou de Jesus: com a soberba de quem já se
considerava quite com as leis de Deus mas queria apenas uma aprovação,
aumentando assim o seu orgulho e sua vaidade pessoal.
Respondeu
Jesus: Se queres ser perfeito, vai, vende teus bens, dá-os aos pobres e terás
um tesouro no céu. Depois, vem e segue-me! Ouvindo estas palavras, o jovem foi
embora muito triste porque possuía muitos bens.
Quando tentamos nos aproximar de Jesus, trazendo
conosco nossa bagagem de vaidosas ilusões, descobrimos que Sua mensagem é um
convite incessante à prática do amor, da caridade e da humildade, combatendo
justamente o orgulho e o egoísmo que ainda nos caracterizam a personalidade.
Julgamos, erroneamente, que Seus ensinamentos poderiam, de alguma forma, alimentar nossa vaidade pessoal, a qual é tão sutil que se disfarça de mil
modos...
Percebendo nosso engano, afastamo-nos, cabisbaixos e
entristecidos, colocando-nos como vitimados pela incompreensão. Nesses momentos
nos perguntamos o que é que ainda nos falta... E Jesus nos responde: falta
desprendimento...
Quando Ele fala de desprendimento, de desapego, não
se refere apenas aos bens materiais mas também à preocupação excessiva em torno
deles. Como dedicaremos algo de nosso tempo às questões de natureza espiritual,
imprescindíveis à nossa felicidade futura, se nossa atenção está totalmente
voltada às questões de ordem material?
Foi isso que o jovem rico não conseguiu compreender
naquele momento. Considerando-se quite com as leis da Tora, pensava em
conseguir somente a aprovação de Jesus para suas realizações de ordem material.
Ele não tinha intenção de tornar-se bom; queria apenas fazer algo de bom, o
que, em muitos casos, é um meio de alimentarmos nossa vaidade. E ficamos
frustrados quando não conseguimos alimentá-la...
Em nossos momentos de desânimo diante dos
ensinamentos de Jesus, mesmo acreditando em suas orientações, quando
perguntamos a nós mesmos o que estaria nos faltando, recordemos essa lição:
falta desprendimento, de tudo e de todos, dos bens materiais, da posse sobre os
outros, do domínio sobre toda e qualquer situação... O desprendimento nos predispõe à tranquilidade
mental para conseguirmos dar um pouco mais de atenção à sublime mensagem de
Jesus...
(Tema abordado na reunião pública do dia 13 de fevereiro de 2012)
Texto perfeito! Adorei a leitura!
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